terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

sobre o filme José e Pilar (2010), de Miguel Gonçalves Mendes

O documentário português José e Pilar certamente é um dos filmes mais emocionantes que já vi até então. Como grande parte dos espectadores, eu conhecia as obras do escritor português Saramago, mas nada de sua vida pessoal, muito menos sabia da influência de sua esposa, a espanhola Pilar del Río. Sem invadir a privacidade, o filme mostra a relação deles de um modo muito espontâneo e doce. Chorei muito durante a exibição pois não conseguia deixar de pensar na morte de Saramago e como Pilar deve ter sofrido. O filme entra bastante na questão da morte e o escritor fala abertamente sobre isso. Já Pilar prefere falar sobre a vida pois, segundo o próprio Saramago: "eu tenho ideias para a arte, Pilar tem ideias para a vida".


Abaixo, reproduzo uma nota que escrevi para o r7.com, em 14/08/2010, sobre a pré-estreia do filme na Festa Literária Internacional de Paraty:

Somente 40 minutos do documentário José e Pilar, de Miguel Gonçalves Mendes, foram exibidos no último sábado (7), na 8ª Festa Literária Internacional de Paraty. A obra foi filmada em três anos e, antes de ser editada, tinha 200 horas de gravação. O cineasta português participou de debate após a exibição do filme, que mostra o relacionamento do escritor José Saramago com sua esposa Pilar del Río.

Morto aos 87 anos em sua casa, o longa mostra Saramago em momentos reflexivos, falando sobre a morte, pelo fato de “ter estado e já não estar” e seu desejo de “morrer lúcido e de olhos abertos”. Apesar de triste, o filme também é otimista e bem-humorado, com cenas em que ele aparece jogando Paciência em seu computador.

Mendes acompanha os anos de lançamento do livro A Viagem do Elefante e a agenda lotada de Saramago, que ao ser questionado por que não diminui o ritmo das viagens responde que “o tempo aperta”. Ele confessa estar farto de dar entrevistas, das sessões de autógrafos intermináveis enquanto algumas cenas da coletiva feita no Brasil são exibidas.

O cineasta português estreou no cinema em 2002, com o curta-metragem documental D. Nieves, sobre a relação entre Galiza e Portugal. Saramago gravou uma narração para este filme e logo foi convidado pelo diretor para ter sua vida retratada, mas recusou. Em 2004, Mendes lançou Autografia, documentário sobre o pintor surrealista e poeta Mário Cesariny e o mostrou para Saramago ainda na insistência do convite. O escritor gostou do filme e revelou para Mendes que tinha medo de não ser tão interessante quanto o poeta.

O filme não possui entrevistas e, dificilmente, Saramago fala diretamente para a câmera. Mendes acompanhou o escritor em uma má fase, em que estava adoecido. O cineasta se mostrou inconformado pelo fato do presidente de Portugal, Aníbal Cavaco Silva, não ter comparecido ao enterro.

O escritor tinha 60 anos quando começou a escrever. Comunista, ateu, não pertencia à elite portuguesa. Sua mulher Pilar é peça-chave na divulgação e na internacionalização de sua obra. Eles se conheceram em 1986, no lançamento de A Jangada de Pedra. O foco principal do filme é o amor vivido pelo casal, conta o diretor.

- Ele era o português melancólico e ela a força espanhola. No início, o filme se chamaria União Ibérica, como uma metáfora do casal, mas José e Pilar é mais simples, como eles eram. Não quis fazer um filme sobre a obra de Saramago, mas da intimidade de um casal extraordinário. Outros documentários já exibidos na televisão mostram sua obra. Eu só não queria que fosse tão cronológico.

O cineasta disse que o filme é sobre o comportamento dos dias de hoje e, principalmente, sobre a morte.

- Eu tenho um pânico imenso de morrer. Acho que por isso faço filmes com essa temática, na tentativa da pacificação.

José e Pilar foi recusado pelo Instituto de Cinema de Portugal para ganhar recursos. Restou a Mendes mandar um e-mail para as produtoras El Deseo, de Pedro Almodóvar, e o2 Filmes, de Fernando Meirelles, que toparam e se juntaram a sua própria, JumpCut. O cineasta revela o quanto é difícil fazer cinema em Portugal.

- O filme ficou muito caro por causa de todas as viagens que fizemos ao lado de Saramago. Estou com dívidas de 100 mil euros e tive que quitar a minha casa.

Para ter o filme que queria, Mendes confessa que precisava de mais seis meses para editar. O primeiro corte tinha seis horas e foi condensado em duas.

- Assim fica difícil saber se o que inclui no documentário é bom. Para construir confiança com o casal, passei muito tempo filmando. Gravamos seis horas de reunião dele com a editora, mas não usamos nenhum minuto. Era só para fazer eles esqueceram a câmera.

Um comentário:

  1. José e Pilar é maravilhoso. Sou suspeito pra falar, pq era um dos meus autores favoritos, como deve ver pela foto do meu avatar. O filme é emocionante do começo ao fim e duas coisas me emocionaram muito: a gravação que ele faz pra Pilar e a leitura (só em áudio) de um trecho do livro O Evangelho Segundo Jesus Cristo.

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